Caçando a Partícula Fantasma
Desde o século 5 a.C., quando os gregos Leucipo e Demócrito propuseram a ideia do átomo, imaginava-se que ele era indivisível, ou seja, que ele era a partícula fundamental a partir do qual todas as coisas que vemos se formavam. Porém, em 1911, Ernest Rutherford, um físico neozelandês, descobriu experimentalmente que os átomos tinham uma estrutura interna: um minúsculo núcleo formado por prótons e nêutrons e uma nuvem de elétrons que giravam ao seu redor. Assim, o próton, o nêutron e o elétron passaram a ser os constituintes elementares da matéria.
Partícula é uma parte muito pequena; elementar significa primário, fundamental. Assim, partícula elementar em física é aquela parte pequena da matéria que não pode mais ser dividida.
Você deve pensar que o nêutron só fica lá dentro do núcleo do átomo, não é mesmo? Mas se tirarmos um nêutron de lá, ele não se aguenta sozinho e se desintegra em aproximadamente 15 minutos. Desintegrar significa desaparecer e gerar outra coisa em seu lugar.
Observa-se experimentalmente que, quando o nêutron se desintegra, ele dá lugar a um próton mais um elétron, como mostra a figura abaixo:
Aparentemente, essa desintegração está correta, pois a carga elétrica antes e depois da desintegração é conservada (carga elétrica do nêutron = 0; carga elétrica do próton = +1; carga elétrica do elétron = –1). Mas observe as direções que o próton e o elétron seguem, indicadas pelas setas.
Experimentalmente, observa-se que o ângulo formado entre essas duas direções é sempre menor que 180°. Você não acha que está faltando alguma coisa? Talvez seja meio difícil responder olhando as partículas, então, imagine uma bomba parada que explode. Se as setas das figuras abaixo representassem a direção dos pedaços da bomba após a explosão, qual das opções representaria melhor: a ou b?
Se você respondeu a opção "a", acertou. Vai um pedaço para cada lado. A opção "b" só estaria correta se a bomba fosse jogada da esquerda para a direita e explodisse enquanto se deslocasse. Da mesma forma, uma garrafa de vidro, quando cai no chão e quebra, os cacos vão para todas as direções.
Você também percebe que os cacos maiores (com maior massa) ficam mais próximos ao lugar onde a garrafa caiu; e os menores (com menor massa), mais afastados. Simples experiências como essas nos levam a acreditar que a energia e o momento (ou quantidade de movimento) se conservam durante um processo físico. Se você ainda não aprendeu isso, certamente aprenderá.
Agora, vamos voltar para as nossas partículas. Intuitivamente, percebemos que alguma partícula também deveria sair para o lado direito, já que o nêutron, antes de desintegrar-se, encontra em repouso:
O problema é que na época em que essa desintegração foi estudada, não era possível detectar essa partícula. Ninguém conseguia medir nenhum rastro deixado por ela, parecia uma partícula fantasma.
Para tentar resolver esse mistério, muitos cientistas sugeriram que a lei de conservação de energia estava sendo violada e que a desintegração do nêutron em apenas um próton e um elétron estava correta, ou seja, não haveria nenhuma partícula fantasma. Outros acreditavam que se tratava, de fato, de uma nova partícula, mais difícil de ser observada e que faria a desintegração do nêutron ser escrita como:
A existência dessa nova partícula foi confirmada em 1956 e chamada de neutrino, porque pareciam ser nêutrons muito leves (“neutrinhos”). Ela é representada pela letra grega n (nu). Novas experiências foram feitas com essas partículas microscópicas e fortaleceram a hipótese de que elas existiam.
Hoje, sabemos que existem muitas outras reações no mundo das partículas elementares em que os neutrinos aparecem. Uma delas é uma reação que ocorre dentro Sol e faz com que ele brilhe. Trata-se da transformação do hidrogênio em hélio, produzindo neutrinos:
Os neutrinos, depois de serem produzidos no interior do Sol, passam a viajar no espaço e alcançam a Terra. O curioso é que sempre que o elétron aparece como produto de uma desintegração, lá estará seu parceiro fiel, o neutrino do elétron, como você pôde ver na transformação acima, e na desintegração do nêutron.
Uma medida, sem precedentes, da quantidade desses neutrinos solares foi realizada em 1996 e premiada em 2002. Raymond Davies Júnior e Masatoshi Koshiba ganharam o Prêmio Nobel de Física por suas contribuições na medição dos neutrinos que vêm do Sol. Você pode não acreditar, mas, enquanto está lendo este texto, existem trilhões de neutrinos atravessando o seu corpo! Você ficou chocado? Preocupado? Não se preocupe, porque, para os neutrinos, seu corpo é transparente e por isso eles te atravessam sem que nada aconteça.
Ana Helena de Campos